terça-feira, 19 de janeiro de 2016

Despair

Ele deu outro trago em seu cigarro, profundamente. Soltou a fumaça lentamente, apreciando cada segundo que o aproximava mais da morte. Tomou o último gole de seu uísque já aguado, se levantou da mesa imunda, pagou sob um olhar de desagrado do barman. Sempre desapontando as pessoas, pensou sem humor. Por que sempre somos julgados e apontados tão bruscamente por oportunidades que nunca tivemos? Nada mais restava, não mais esperança, nem vontade de viver. Pegou seu casaco e saiu da meia luz proporcionada pelo pub, encontrando uma chuva fina e indefinida numa rua deserta e mal iluminada. Andava tropegamente, não pelo álcool, mas pela vida que agora pesava como uma condenação. Onde tudo acabou? Quando deixou de existir, até para si mesmo?

Aprendeu cedo que a vida não era fácil, e que teria de batalhar pelo que queria, e assim o fez. Até que um dia, num entardecer úmido, numa calma vazia, descobriu que estava solitário, que não sabia mais porque batalhar. Poderia enfrentar a vida, não tinha medo, nem preguiça de o fazer. Mas por que deveria se dar ao trabalho? Se sentiu só, seu trabalho não lhe dava qualquer tipo de satisfação. Nem mesmo as coisas de que um dia havia gostado de fazer o animavam a viver. Quando tudo perdeu o sentido? Caminhava devagar, já sem medo das ruas escuras e mal frequentadas. Há muito havia percebido que a sociedade é um hospício em grande escala, e que se tem de manter a farsa e viver prisioneiro das futilidades e do medo por ela impostos. Percebeu a desimportância, o vazio, proporcionado por seu trabalho de homem de terno. Sentado atrás de uma mesa, pensando em como arrancar mais dinheiro e desespero de quem não mais os tinha para oferecer.

Entrou em pânico, largou tudo. Uma camada de mormaço passou a encobrir sua vida. O dinheiro que tinha foi desaparecendo, e com ele seus supostos amigos. Observou-os ir, passivamente. Todo o sarcasmo e autopiedade de uma vida o abandonaram. Nada possuía, e nada o possuía. Sentiu a liberdade triste dos que nada tem a perder, e abraçou o vazio do álcool e do cigarro, que lhe trariam uma passageira sensação de bem estar, e também o levariam a um fim mais rápido. Não temia um castigo posterior, mas também nunca tinha tido esses arroubos de coragem que fazem a humanidade evoluir de tempos em tempos.

Tremendo de frio, encharcado em uma madrugada qualquer, continuava em busca de seu mais novo objetivo. Não encontrou vivalma, assim como não havia encontrado abrigo ou esperança, até chegar à ponte. Contou onze passadas largas até atingir a metade da ponte. Olhou para os dois lados. Ah! Que a esperança nunca nos abandona, mas não raro nos decepciona. Observou a névoa que já quase se havia dissipado pela chuva. Uma forte rajada de vento o atingiu, balançando os cadeados presos às grades já enferrujadas da ponte. Quantos sonhos se terão realizado? E quantos terão morrido, convulsos em desespero? Segurou a grade, içando-se para seu destino já pintado em negro. Tomou fôlego e se jogou no vazio à sua frente, fugindo para sempre do vazio de sua vida.

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